Uma regata “única no mundo”

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Por Aida Maria

A corrida anual de barcos rabelos é uma das tradições mais marcantes no rio Douro. Em 1792, foram publicados os alvarás que lhes concederam identidade própria, pela Companhia Geral da Agricultura das Vinhas do Alto Douro (CGAVAD) – criação do Marquês de Pombal. A concorrência de meios de transporte alternativos quase os fez desaparecer entre as décadas de 1960 e 1970, mas a perseverança das casas de Vinho do Porto ressuscitou este importante símbolo de um dos produtos mais icónicos da economia e cultura nacionais.

O barco rabelo
As características da construção dos barcos rabelos inspiram-se em modelos nórdicos de carpintaria naval. Têm entre 19 e 23 metros de comprimento, 4,5 metros de boca, com fundo chato e vela quadrada. O nome “rabelo” advém da sua imensa espadela em forma de rabo, que serve como leme. Cada barco tinha uma tripulação até 12 homens e podia transportar até cerca de 100 barris. Nos finais do século XVIII, nas “Leis da Companhia”, da CGAVAD, fundada em 1756 – que criou a primeira região demarcada do mundo – aparecem já informações ligadas ao barco rabelo. Nessa altura, e durante o século XIX, cerca de 2500 destes barcos cruzavam o Douro. Com a construção da ferrovia duriense, em 1887, e com o incremento da rodovia no século XX, os rabelos deixaram de ser o único meio de transporte do Vinho do Porto, desde o Alto Douro até às Caves de Vila Nova de Gaia. Como tal, foram perdendo importância…

O rio Douro
Era um rio de correntes rápidas e turbulentas, que os marinheiros dos rabelos tinham de enfrentar nas suas perigosas viagens e onde se perderam muitas vidas. As pipas de vinho não eram cheias completamente, para que, em caso de acidente, pudessem flutuar. Só a partir da década de 1970, com a construção de barragens, foi possível “acalmar” o rio. O Douro é, agora, considerado uma via navegável comercial com características internacionais e modernas.

A Confraria
A Confraria do Vinho do Porto, cujo patrono é o Infante D. Henrique, foi criada em 1982. “Difundir, promover e consolidar o nome do Vinho do Porto em todo o mundo” foram os propósitos que levaram à sua  fundação. É também graças a ela que se realiza anualmente, no dia 24 de Junho, a Regata dos Barcos Rabelos.

A festa dos tripulantes das embarcações das Regatas dos Barcos Rabelos, em Vila Nova de Gaia

A Regata
Como manda já a tradição, as regatas realizam-se no Dia de S. João, entre a Marina da Afurada e a Ponte Luiz I. Apesar de o mais importante ser participar, a luta pelo primeiro lugar é sempre renhida, estando a entrega dos troféus a cargo do Chanceler da Confraria do Vinho do Porto, George Sandeman. Com família ligada ao sector desde finais do século XVIII, Sandeman nasceu em Londres em 1953 e mantém ainda um leve sotaque, como comprovou o Vozes de Gaia.

George Sandeman, Chanceler da Confraria do Vinho do Porto

Há quanto tempo está em Portugal?
Os portugueses deixaram-me entrar em 1990 e aqui continuo.

Tem alguma quinta no Douro?
Não. Estive ligado às empresas de vinho, mas estou a desligar-me – uma espécie de reforma – e quero dedicar-me à Confraria.

Há projectos novos no horizonte?
Estamos a trabalhar, com outros parceiros, na candidatura dos Barcos Rabelos a Património Mundial da Humanidade. Foi aprovada, em 28 de Maio último, a Resolução n.º 172/2021 da Assembleia da República que, entre outras coisas, “recomenda ao Governo a salvaguarda do Barco Rabelo e do património naval do rio Douro”.

E além desse?
Queremos dar visibilidade internacional à Regata dos Barcos Rabelos, pois é única no mundo! Desejamos trazer o mundo aos Rabelos! Ela está inserida nos festejos das “Festas Populares” com a duração de um mês, mas gostaríamos que tivesse um impacto mais duradouro, associado a provas de vinho, a pequenas aulas e outras coisas que atraíssem as pessoas a esta paisagem natural e maravilhosa do Cais de Gaia.

É o microclima do Douro que torna único o Vinho do Porto?
Sim, mas não só. Aqui em Gaia, perto do rio, com os seus nevoeiros e humidades, também se gera um microclima que contribui para o envelhecimento do vinho nas Caves, de forma a torná-lo ímpar.