Sr. da Pedra – a igreja que podia ser um forte

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Foto: PÚBLICO (ARQUIVO)

A igreja do Sr. da Pedra, em Miramar, é hoje um dos ícones da costa nortenha. Mais turístico do que religioso. Por ironia, até o próprio padre responsável pela sua construção em meados do século XVIII preferia antes ver ali um forte que defendesse a sul a entrada da barra do Douro, tal como fazia o de S. João da Foz, no Porto. O assunto andou pelas mãos do Marquês de Pombal.

Raposo Antunes

Assente num pequeno promontório que domina o areal de Miramar, a igreja do Sr. da Pedra é hoje um dos cartazes turísticos do litoral nortenho. Guias e roteiros internacionais classificam este conjunto como um dos mais belos, isto na secção das praias europeias. Excursões de fiéis e de turistas calcorreiam diariamente as duas centenas de metros de areal que têm de atravessar para chegar à igreja, sugerindo a existência de verdadeiras peregrinações. Ao mesmo tempo, a própria empresa turística de helicópteros que cruza os ares do Porto colocou o Sr. da Pedra como o ex-libris das suas viagens aéreas. E as televisões portuguesas recorrem constantemente a este postal ilustrado de Gaia.

Quis o destino que este maciço rochoso, constantemente varrido pelas ondas do mar onde assenta agora a igreja e o culto dos fiéis, tivesse escapado por pouco a um fim bem menos espiritual. Em meados do século XVIII, ainda antes da haver ali qualquer construção, a grande pedra da Asureira, como era identificada nas Memórias Paroquiais de Gulpilhares, documento datado de 1758 e da autoria do pároco José Barbosa Pereira, é sugerida para servir de suporte à construção de um forte militar que protegesse a entrada a sul da barra do Douro, funcionando como uma espécie de complexo de artilharia semelhante ao existente a norte do rio, ou seja o Forte de São João da Foz.

A sugestão de José Barbosa Pereira é feita a outro padre que tinha sido nomeado pelo Marquês de Pombal para fazer uma espécie de cadastro de cada paróquia.

Manuel Joaquim Moreira da Rocha, da Universidade do Porto, utiliza estas Memórias Paroquiais no seu livro sobre o Sr. da Pedra. E cita mesmo o padre José Barbosa Pereira: “Desta pedra (da Asureira) se descobrem os castelos de São João da Foz, do Queijo e de Matosinhos e nela se pode fazer um fortim que defenda esta costa do mar até à barra do Porto. Porque as balas de artilharia do castelo de São João da Foz e as que podem pôr neste fortim (Sr. da Pedra) seriam suficientes para defender o que está de permeio entre uma e outra distância”.

Curioso, ainda segundo Moreira Rocha, é que o nome deste padre surge depois associado à criação da capela do Sr. da Pedra. Não se sabe ao certo porque fracassou o projecto militar do padre José Barbosa Pereira. Seguramente que o Marquês de Pombal e D. José I lá teriam as suas razões.