Solo do interior Norte estão “secos, como no Alentejo”

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Entrevista a João Morais, da Associação dos Agricultores e Pastores do Norte por Dina Costa

Em entrevista ao Vozes de Gaia, João Morais, director da Associação dos Agricultores e Pastores do Norte, defende a construção de mais barragens como forma de prevenir futuras situações de seca. No Norte, as terras já fazem lembrar a aridez do Alentejo, lamenta. O Instituto Português do Mar e da Atmosfera apontava, a meio de Fevereiro, para mais de 90% do território continental de Portugal em seca severa ou extrema. Entretanto, Portugal e Espanha já solicitaram apoios financeiros a Bruxelas para minorar os impactos da seca.

VOZES DE GAIA – Em que aspectos é que a agricultura evoluiu nos últimos 20 anos?

JOÃO MORAIS – Evoluiu em conhecimentos. Hoje, o agricultor preocupa-se muito mais em fazer correctamente, procurando conhecer os terrenos e os produtos que cultiva. Claro que ainda há agricultores que cultivam como os pais faziam, até porque alguns já são muito idosos e não vêem razão para mudar. Mas cada vez mais se verifica essa preocupação.

O tipo de culturas que praticam está a ter em conta a escassez de água?

Sim. O agricultor, de uma forma geral, tem vindo a ajustar as suas culturas à pouca água que tem, até porque sente o problema de muito perto.

Há armazenamento de água para fazer face a estes períodos de seca?

Não. O Norte é um pouco o espelho do que se passa no resto do país. Do litoral até ao interior, há água nos solos. A partir de Vila Real, e até Bragança, a situação muda. Os solos passam a ser secos, como no Alentejo. Aqui, os agricultores valem-se de pequenos tanques, charcos, furos e de algumas barragens. Se tiverem água. O que não é o caso da Barragem de Pizões, em Montalegre, por exemplo. Além de ter pouca água, é exclusivamente para a produção de energia.

Que ajudas chegam por parte do Estado?

Os agricultores estão muito preocupados, além da seca na agricultura, pois há o problema dos animais. Se esta situação se mantiver por muito tempo, ficam sem alimento para lhes dar. Era preciso que a ajuda viesse em tempo útil. Promessas há…

As minas de água ainda são usadas na agricultura?

Claro… quem as tem. Mas a água que está nos lençóis freáticos é cada vez menos à medida que são feitos mais e mais furos. Os recursos não são inesgotáveis. 

A agricultura de subsistência ainda existe em grande número?

Existe. Principalmente, aquele agricultor que tem outro trabalho, fora de casa, e que não dispensa tratar da sua horta ao fim-de-semana. Não para comercializar, mas para consumo próprio.

E esses pequenos agricultores juntam-se em associações?

Sim. Na nossa associação temos cerca de dois mil associados. Eles juntam-se, trocam ideias e alguns até fazem pequenos cursos de formação. Costumo dizer, a rir, que eles agora são agricultores encartados, têm mais responsabilidade.

O que devia ser feito para minimizar a falta de água na agricultura?

Há muito que defendo a construção de mais barragens. Mas não só. Não se compreende que continuemos a gastar água potável nas nossas sanitas e na rega. Toda a água das nossas casas devia ser reciclada e usada para esse fim. Acho que é hora de deixar de olhar para o lado e enfrentar o problema de frente.